Diversidade e Literatura
 



Dicas

Diversidade e Literatura

entrevista com Tônio Caetano


A diversidade, em seu mais amplo sentido, é um tema sensível e muito necessário em um país tão plural como o nosso. E a literatura, por trazer muito do tempo e do contexto social em que o autor está inserido, não poderia negligenciar toda a diversidade étnico-racial, de gênero, sexual, de corpos etc presente em nossa sociedade.



Além da relevância social da diversidade na literatura, imagine um romance contemporâneo ambientado no Brasil, em que os personagens sejam todos iguais: mesma cor de pele, classe social, orientação sexual. Soa até inverossímil, não é mesmo? Também é importante ponderar quais papéis esses personagens estão exercendo.

E como inserir a diversidade nas narrativas? Quem dá dicas sobre esse assunto é o escritor Tônio Caetano, autor do livro "Terra nos cabelos" (Editora Record), Prêmio SESC de Literatura 2020 na categoria Conto, e do livro Sobre o fundo azul da infância (Editora Popular Venas Abiertas). Ele é servidor público municipal, egresso do Curso Livre de Formação de Escritores, especialista em Literatura Brasileira pela PUCRS e integra as coletâneas Contos de mochila, Minicontos de amor e morte, Planeta Fantástico e Ancestralidades: escritores negros.

De que maneira o autor pode inserir a diversidade em suas narrativas?

Para escrever um personagem autêntico, inteiro, que foge ao histórico/colonial, o escritor vai ter que ler, pesquisar, também passar pelo processo de identificar e reconhecer e se despir dos seus próprios preconceitos e padrões. O mundo é diverso. Se alguém entrar em qualquer ambiente com dez pessoas, por exemplo, serão dez pessoas diferentes. Porém, por muito tempo, quando a diversidade era algo distante na literatura, os personagens eram física e mentalmente quase sempre os mesmos. A pesquisa da Profa. Regina Dalcastagnè sobre o personagem do romance brasileiro nos mostra um pouco desse painel. Quando escrevi `Terra nos cabelos`, construir mulheres diversas foi uma das minhas grandes preocupações, não só fisicamente, mas também socialmente e com subjetividades diferentes. Diversidade é um compromisso que precisamos cada dia mais assumir na literatura e na vida.

Quais expressões ou terminologias deve-se evitar?

A literatura é um lugar de liberdade, é possível escrever sobre qualquer coisa. Mas existe um outro momento que é o da publicação, que envolve a recepção do leitor. Então o escritor precisa unir essa liberdade com a responsabilidade. A gente tem que se perguntar se aquela palavra ou expressão é extremamente necessária para o enredo. Em se tratando de diálogo e caracterização do personagem, pode ser que caiba algo que não cabe na vida real, mas cabe para caracterizar o personagem, destacar algum tipo de preconceito presente no conflito. É preciso saber lidar na literatura com personagens que na vida real queremos distância. Escrever é também lugar para tomar decisões, conscientemente.

Em outra entrevista, quando perguntado sobre o lugar de fala, você respondeu que esse conceito "é sobre disputa de poder, sobre quem domina os espaços privilegiados de fala na sociedade?. Como você enxerga o lugar de fala na literatura?

Lugar de fala é um conceito amplo e profundo. É sobre poder, disputa, presença, dominação de espaços. Lugar de fala é também a consciência de que não existe lugar neutro, lugar universal. Todas as pessoas falam e escrevem de um lugar específico. O mais importante é que o leitor consiga perceber isso e, a partir desta percepção, adentre no que a fala/escrita traz como se não trouxesse. Como disse antes, é possível escrever sobre qualquer coisa. Uma pessoa branca pode escrever personagens negros, alguém que seja heterossexual pode escrever personagens LGBTQIA+ e vice-versa. A questão segue sendo a ética, a responsabilidade, por parte de quem escreve, claro, em conjunto com o olhar do leitor, a recepção.

 

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